aman 62

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

         

Crônicas do Cruzeiro Marítimo no Opera

O último ato - Baixa o pano do Opera

 

Hiram Câmara

5° e último dia

Ao sair do Restaurante do 5º. Deck - aquele mesmo em que os garçons haviam servido um pouquinho disto e um pouquinho daquilo, no dia em que Mendes e Alda lá haviam estado.

Um dos assuntos do “escritório” – como não poderia deixar de ser, foi, mais uma vez alimentação, desta vez, o café da manhã.
Pois, vale a pena voltar ao assunto: ficamos com a impressão de que ou o Mendes e Alda tiveram pouca sorte ou nós tivemos muita. Fomos muito bem servidos.
A grande diferença para os restaurantes “self-services” está na rapidez com que se serve ou se é servido. No “a la carte”, o ritmo é de valsa. Nos outros é o do “frenetic dancing days”. No primeiro, os garçons circulam, servindo cada mesa, quantas vezes se queira. Apenas, os garçons servem pouco de cada vez. Um pouquinho disto, um pouquinho daquilo..
Levamos 45 minutos no café, e fomos servidos várias vezes com esses “pouquinhos”. Um garçom negro, muito elegante, aproximou-se e perguntou, de forma gentil: -“Coffee, sir?” Percebia-se ser um homem de muito boa formação. Senti que ficou feliz quando respondi “ Yes, please.” Entendi que gostava de servir. –“ Milk, sir? A little?” E eu, satisfeito de gastar um pouquinho de inglês: -“ Yes, thanks”. Ele servia com extrema classe. Podia até parecer que eu estava me mostrando para Cláudia, professora de Inglês - vai ver, estava mesmo, um pouquinho -, mas é que era a primeira vez, em cinco dias, que um garçom não falava comigo – nada contra – em indonésio, romeno, croata, russo ou no mais próximo do latim, em italiano.
E eu me senti bem mais confortável, pasmem, trocando alimento por palavras em inglês. Já um indonésio se aproximava com uma cestinha cheia de variados e delicados tipos de pães. Ouvindo-me “enganar” em Inglês, arriscou: -“ Bré-di, sêr”. Ficou feliz, também, com minha resposta, mas creio que, não por eu haver aceito, mas por haver entendido o que oferecia.
Já, retorna o garçom negro, sorridente, simpático, com café em uma das mãos e leite na outra. - “ A little more, Sir? Coffee and milk, Sir?” E eu, observado pela professora, continuava a praticar minha fluência: “Yes, thanks”. E o garçom enchia outra xícara.

Isso, sem deixar passar um outro garçom que, sem falar nada, inundava a mesa com “pouquinhos” de geleinhas, manteiguinhas, queijinhos, presunto, e se mandava.

Numa dessas, entre um “bré-di” e um “milk”, lá vem o negão simpático – já discutíamos Claudia e eu, se era inglês oriundo da África ou da Guiana ou Antilhas – quando um outro garçom de língua espanhola se aproxima dele e fala em espanhol. E então – era impossível deixar de ouvi-lo - o “deus etíope”, como diria Nelson Rodrigues, responde-lhe em um legítimo...portunhol!!!
Fiquei na minha. Mais uma vez, vem o etíope. “A little more, sir?” Desta vez, foi ele quem se surpreendeu: “ Não, obrigado”.
A ficha só caiu quando ele se preparava para se afastar. Parou e perguntou em português perfeito: “São brasileiros?”
E, então esqueceu-se que podia ser garçom inglês ou deus etíope: “abrasileirou-se”. Desandou a falar em português, creio que por necessidade atávica e anímica. Há oito anos navegava. Feliz com o que fazia. Levara a família para a Europa. Saudades? Muitas, particularmente de falar português, de arroz tropeiro e chuleta. Quer dizer, além de inglês e deus etíope era, ainda por cima, gaúcho!!! O maître já o observava com olhar de multa, quando ele começou a colocar café na minha xícara e eu entendi. Queria esticar um pouquinho mais a fala em português. E disse: “ Esse café é muito ruim. Tem nada com o nosso café. E o leite, o senhor achou gosto, nele?”

Para induzir o maître a não aplicar-lhe uma multa –maior castigo para um funcionário que falhe no serviço – tomei (desculpe, Cardoso) , sorvi – meia xícara e o que respondi, baixo, no ouvido dele, em inglês, sobre o café, fez-me lembrar o apelido dado pelos Cadetes àquele primeiro edifício construído em Resende: “Maior Edifício de Resende Depois da Academia”. Lembram-se?

Mais uma vez, passa pela nossa mesa o garçom mudo.

Desta vez, apenas vasculha com os olhos o que já comemos e completa as faltas com outros pouquinhos de geleinhas, manteiguinhas, queijinhos, presunto e se manda. Na quarta vez que se aproximou calado, não pude deixar de me lembrar de um livro que li, na década de 50, sobre marinharia do século XVII, em que era costume, o marujo que servia a Câmara do Comandante, ter sua língua cortada para não repassar o que ouvia, ao servi-lo. Levantamo-nos, pois aproximava-se, célere, outro indonésio, ameaçando oferecer “bré-di,” novamente.

Quando íamos deixar o Restaurante, passamos pela mesa em que estavam Ayres e Lia, que também sorviam “cófi - milk an-di bré-di” servidos pelo dedicado garçom indonésio – o “nosso” garçom indonésio.

Sentamo-nos, para fazer-lhes companhia, e um outro indonésio( tenho certeza de que era outro, porque no último dia, já começara a perceber sutis diferenças entre eles. A mais sutil delas, a do nome no crachá) com distinção e classe, aproxima-se com uma bandeja, e prepara-se para nos oferecer “ cófi-milk en-di bré-di”.

Agradeci. Disse-lhe que já havíamos sorvido nossos cafés – sucessivamente, e diante de seu sorriso extremamente simpático, em espanhol, inglês, francês e, até naquele mandarim do outro dia - e ele sempre respondendo “si, si, si”, sorrindo. Não teve mais dúvida: colocou xícara, etc, “en-di bré-di”, “au grand complet”. Desisti.

Ayres colocara à nossa frente, a câmera e no visor, víamos fotos que tirara de madrugada, depois do jantar. Lembram-se do que, nos programas diários, aparecia como “Surpresa do Chêf ”? Pois bem: as fotos que tínhamos à frente eram de um festival gastronômico inigualável. Ayres e Lia estavam deslumbrados. E não era para menos. Fora uma festa de arromba.

Retornamos à Cabine e dela nos despedimos. Haviam sido momentos inesquecíveis, e ocorreu-me que aqueles espelhos tinham uma qualidade sobre todas: os espelhos eram multiplicadores de nossa memória. Hoje, quando lembro da Cabine que ocupamos, guardo-a com perfeição na memória, não só porque nossos neurônios talvez ainda estejam razoavelmente em ordem, mas porque vimos várias vezes as cenas que vivemos, em diversos ângulos.
Assim, ao forçar nossos dois milhões de velhos neurônios a recomporem o que vivemos nesses relatos, eles percebem se haverem potencializado, pela leitura das imagens que fizeram dos espelhos. Só este fato, anula minha reação ao espelho lateral no qual me assustava ao ver-me com a cara de quem se levanta sem alertar a si próprio.
Fui a varanda, de frente para a Ponte Rio-Niterói.
Foi minha última visão do mar da Baía de Guanabara, na viagem, de dentro do Ópera; agora, restava desembarcar, no Grupo número 02- de cartão vermelho.



Post Scriptum

Nada restava aos passageiros senão descer a rampa e pisar o cais. O segredo: não olhar para trás.

Vinham dois rapazes conversando e passaram por nós. Um deles ia folheando a Play-Boy. Era impossível deixar de ver a moça da página central. O outro tinha no rosto uma expressão de saudade.

Ouvi este comentar:

- “E pensar que já estive dentro disso aí! Será que vou ter uma segunda chance?”

E o outro, alternando duas vezes, o olhar descrente para a foto e para o companheiro:

- Peraí, cara: você, já..., quer dizer... com essa gata aqui??!!”

E o primeiro, desfazendo o mal entendido:

- “ Pó, cara, que gata, nada! Eu tô falando é do Opera!”



Foi então que olhei para trás. O deslumbramento de seus 11 decks, a extensão olímpica de seu costado, um sonho realizado. Tomei emprestada a frase daquele jovem e pensei, mirando-o, aos sessenta e oito anos, quase 40 de “ infantiria reiúna”, ainda imaginando uma segunda chance: “E pensar que já estive dentro disso aí!”

Tantas lembranças passaram pela mente. As dúvidas indevidas sobre as malas. As primeiras impressões sobre os garçons no primeiro jantar. O que não era positivo se apagou, nos momentos vividos com essas mesmas pessoas nos dias que se seguiram, com um ambiente alegre, descontraído, respeitoso e muito agradável. Adi – nosso indonésio preferido- e Cyprian, o garçom romeno, em quatro dias, quiseram aprender a dizer “muito obrigado”. Gravei este momento, em nossa mesa, e , pelo menos, uma expressão aprendemos a falar em indonésio – “Prima kaci” - “muito obrigado”, em indonésio.

Quantas pessoas passaram pelas nossas vidas em um instante fugaz de breve conversa ou com um simples cumprimento, como pequenas formigas que passam umas pelas outras, param, têm um breve encontro de vida e prosseguem sua faina. Quantas vezes isto ocorreu nesta viagem!

E, provavelmente, jamais nos encontremos novamente. Como gostaria de saber do êxito permanente do duo que todas as noites nos encantava com música italiana e que homenageou D’Elia e Marli, em seu aniversário de casamento.

Como seria bom saber que todo o elenco dos shows, e dentro dele, alguns brasileiros, como a maravilhosa cantora, que vive na Itália, com a qual conversamos Carlô e eu, parabenizando-a pela voz e pela arte, estão brilhando sob as luzes da vida e da felicidade.

Como seria bom saber que as moças da recepção, que nos atenderam, sempre com muita atenção, e colaboraram com as solicitações da Coordenação, receberam nossos agradecimentos e nosso carinho Tuducax.

Como seria bom que o pessoal que prestou apoio eventual aos participantes do grupo Tuducax com alguma restrição de locomoção soubesse de nossa gratidão.

E que a turma das Comunicações Sociais e do Marketing, que nos manteve sempre informados, por meio do jornal diário, pontualmente colocado por debaixo da porta, soubesse dos elogios que ouvimos sobre sua atividade.

E que todos os que trabalharam, duramente, para manterem perfeitos os restaurantes ao gosto do freguês, soubessem que nada jamais comprometeu a alta qualidade no período de nossa convivência e que todas – todas- as referências nessas crônicas, serviram, apenas, para dar-lhes(às crônicas) mais sabor e tempero, também ao gosto do freguês.

Estejam certos de que correu tudo tão bem, que a única restrição reconhecida por todos foi a do estímulo à tentação gastronômica. Não houve quem mantivesse o peso.
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Nada mais faltava, senão deixar o navio. E passar para uma outra fase do programa, totalmente diversa. Agora, íamos subir a Serra, para ocuparmos “militarmente” o Hotel Villaforte.

E ainda bem que eu preservara o cartão do passageiro: afinal, nele, não parecia estar impregnada a alma?

Caminhamos até a Estação de Desembarque. Agora, era partir para Resende! As malas ali estavam. Organizadas, fáceis de encontrar. Os carregadores faziam o resto. Com um detalhe: este apoio já é incluído, como uma cortesia. Se houvera alguma dúvida no início, agora, a certeza era a de que entregáramos nossa viagem em mãos certas: pela Protravel, nas do incansável, criativo e cooperativo Luiz Pretzel. E, era o momento de fechar a viagem com um reconhecimento à competência da MSN e ao Comando do Opera.

E quem logo encontro? Frei Chiquinho, já no comando decidido de sua van, preparando-se para a segunda parte do programa, ao qual os nordestinos e alguns do Rio, estavam se integrando.

Mas esta é outra estória, que o próprio eclesiástico tuducático Frei Chiquinho, Prior da Ordem das Ovelhas Desgarradas e Vedor da Santa Ordem dos Aratacas Paidéguas contará, a partir da próxima crônica.


Companheiros Tuducax:

Essas cinco crônicas, a cargo de nosso companheiro Hiram, representam o fechamento de nossa atividade nas comemorações dos 45 anos de nosso Aspirantado.

Ao final, os comentários de alta satisfação recebidos pela CNCA atestaram que a proposta de se ir “al mare” deu certo.

A Coordenação está feliz e certa de que muito ainda terá de avançar. De 2002 para 2007, cinco anos se passaram e muito foi aprendido.

De 2007 a 2012, muito se aperfeiçoará.

Até Maceió.

CNCA